No princípio chave do trabalho do André temos encontrado, acima de tudo, as noções interligadas de ausência e tempo, geralmente através da transposição de matéria natural.
Esta matéria, ou a natureza em si, é alegadamente deslocada, num processo de intervenção duplo que deduz a retirada de uma parcela de paisagem do exterior num primeiro momento e, em seguida, a sua deslocação para o espaço expositivo tradicional.
Este ato brutal transporta para a ’galeria’ algo mais além de um corpo orgânico que se confronta drasticamente com as rígidas configurações arquitetónicas; essa mesma brutalidade e a disposição dos elementos estabelece um espaço de incrível tensão onde a performance tem lugar, denunciando o processo construtivo da peça e evidenciando a imagem de um espaço da falta (o que fica de onde foi furtado o bloco que aqui vemos).
As intervenções do André Brígida tendem, assim, a colocar lado a lado as características da natureza e da arquitetura, abrindo a possibilidade para o diálogo entre o carácter permanente e a rigidez impostas pela construção e a instabilidade e efemeridade natural dos elementos orgânicos.
A intervenção que apresentamos nos ateliês do Plano Lisboa e da Casa da Praia, foi pensada exatamente a partir do programa arquitetónico do espaço, tentando desenhar uma peça em permanente negociação com a sala em trapézio, capaz de posicionar o espetador em situações distintas de observação e relação física com o trabalho.
Este lamacento site-specific é complementado por uma pequena projeção de slides, que exibe fotografias de intervenções na paisagem feitas pelo André durante uma viagem a solo pela Europa, intercaladas por mapas que as localizam geograficamente.
Esta pequena e nostálgica peça de consulta, (caindo, ou não, na tendência estética para o uso de dispositivos obsoletos na arte contemporânea), existe aqui como um contraponto à instalação e como um anúncio de um trabalho paralelo, de arquivo e memória, que o André começa a desenvolver precisamente neste momento.
Nesta espécie de Livro de Artista in progress debate-se a memória do próprio autor relativamente às intervenções que vemos nas imagens, bem como a ideia de escultura-memória inscrita nessas paisagens através da mão do artista (estes espaços da falta – escavações, marcações e deslocações).
Ordem e Imprevisibilidade é o elemento central desta exposição e habita a segunda sala deste espaço. Um pedaço de terreno com 110cm de altura, 450cm de comprimento e apenas 12cm de espessura, suspenso na sala de exposição a 65cm de cota, atravessa o espaço expositivo com um ligeiro desvio do centro. Esta peça é constituída por dois blocos de terra posicionados em linha, encimados por vegetação e com as respetivas raízes evidentes nas grandes laterais.
Num primeiro impacto, a sala é dominada pela presença desta secção de paisagem flutuante, que instala um verdadeiro silêncio – o silêncio do qual vive a obra de arte.
Neste espaço, a natureza tem lugar para intervir e assiste-se ao seu processo dinâmico e performativo, realçando o modo como a matéria está em constante transformação.
Mais, define-se um diálogo que toma duas questões fundamentais: a geometria das superfícies laterais da obra desenham um contraste acentuado com as formas irregulares do topo evocando impressões de corte, deslocamento, controlo, limites. Por outro lado, podemos assistir à evolução natural dos elementos que compõem a instalação - as plantas irão murchar, as lagartas caminham por vezes entre a terra, novas plantas aparecem, carreiros de formigas já circularam pela galeria ou a própria peça acabará, talvez, por ruir.
O tempo revela-se o condutor essencial para experienciarmos as dinâmicas que envolvem os trabalhos do André. A duração das peças é imprecisa. Tudo vai acontecendo sem um fim determinado, obedecendo à inexorável passagem do tempo, da erosão, assim como as marcas dos espectadores que os vão experienciando.
Ainda por outro lado, em pleno ambiente natural, o André cria uma ordem que rompe com o ciclo da natureza da área específica em que intervém.
No fim, a natureza encarregar-se-á de reafirmar o seu estatuto.
- Sérgio Azevedo
Esta matéria, ou a natureza em si, é alegadamente deslocada, num processo de intervenção duplo que deduz a retirada de uma parcela de paisagem do exterior num primeiro momento e, em seguida, a sua deslocação para o espaço expositivo tradicional.
Este ato brutal transporta para a ’galeria’ algo mais além de um corpo orgânico que se confronta drasticamente com as rígidas configurações arquitetónicas; essa mesma brutalidade e a disposição dos elementos estabelece um espaço de incrível tensão onde a performance tem lugar, denunciando o processo construtivo da peça e evidenciando a imagem de um espaço da falta (o que fica de onde foi furtado o bloco que aqui vemos).
As intervenções do André Brígida tendem, assim, a colocar lado a lado as características da natureza e da arquitetura, abrindo a possibilidade para o diálogo entre o carácter permanente e a rigidez impostas pela construção e a instabilidade e efemeridade natural dos elementos orgânicos.
A intervenção que apresentamos nos ateliês do Plano Lisboa e da Casa da Praia, foi pensada exatamente a partir do programa arquitetónico do espaço, tentando desenhar uma peça em permanente negociação com a sala em trapézio, capaz de posicionar o espetador em situações distintas de observação e relação física com o trabalho.
Este lamacento site-specific é complementado por uma pequena projeção de slides, que exibe fotografias de intervenções na paisagem feitas pelo André durante uma viagem a solo pela Europa, intercaladas por mapas que as localizam geograficamente.
Esta pequena e nostálgica peça de consulta, (caindo, ou não, na tendência estética para o uso de dispositivos obsoletos na arte contemporânea), existe aqui como um contraponto à instalação e como um anúncio de um trabalho paralelo, de arquivo e memória, que o André começa a desenvolver precisamente neste momento.
Nesta espécie de Livro de Artista in progress debate-se a memória do próprio autor relativamente às intervenções que vemos nas imagens, bem como a ideia de escultura-memória inscrita nessas paisagens através da mão do artista (estes espaços da falta – escavações, marcações e deslocações).
Ordem e Imprevisibilidade é o elemento central desta exposição e habita a segunda sala deste espaço. Um pedaço de terreno com 110cm de altura, 450cm de comprimento e apenas 12cm de espessura, suspenso na sala de exposição a 65cm de cota, atravessa o espaço expositivo com um ligeiro desvio do centro. Esta peça é constituída por dois blocos de terra posicionados em linha, encimados por vegetação e com as respetivas raízes evidentes nas grandes laterais.
Num primeiro impacto, a sala é dominada pela presença desta secção de paisagem flutuante, que instala um verdadeiro silêncio – o silêncio do qual vive a obra de arte.
Neste espaço, a natureza tem lugar para intervir e assiste-se ao seu processo dinâmico e performativo, realçando o modo como a matéria está em constante transformação.
Mais, define-se um diálogo que toma duas questões fundamentais: a geometria das superfícies laterais da obra desenham um contraste acentuado com as formas irregulares do topo evocando impressões de corte, deslocamento, controlo, limites. Por outro lado, podemos assistir à evolução natural dos elementos que compõem a instalação - as plantas irão murchar, as lagartas caminham por vezes entre a terra, novas plantas aparecem, carreiros de formigas já circularam pela galeria ou a própria peça acabará, talvez, por ruir.
O tempo revela-se o condutor essencial para experienciarmos as dinâmicas que envolvem os trabalhos do André. A duração das peças é imprecisa. Tudo vai acontecendo sem um fim determinado, obedecendo à inexorável passagem do tempo, da erosão, assim como as marcas dos espectadores que os vão experienciando.
Ainda por outro lado, em pleno ambiente natural, o André cria uma ordem que rompe com o ciclo da natureza da área específica em que intervém.
No fim, a natureza encarregar-se-á de reafirmar o seu estatuto.
- Sérgio Azevedo